terça-feira, 31 de maio de 2011

Monotemática.

Ontem quando eu saí de casa as cinco da manhã naquele frio aterrorizante e me deparei com a rua completamente deserta, antes que sentisse medo ou raiva, comecei a falar sozinha. Desde fevereiro minhas segundas feiras têm sido assim, as cinco horas lá estou eu: Indo trabalhar. Mas nunca o caminho tinha estado tão silencioso e hermo como ontem. Com certeza foi o frio.
Falei sozinha sobre a razão que me faz aceitar a condição de sair essa hora de casa para ir tão longe. Certamente não são os 681 reais que eu ganho. Também não é, por mais que isso exista, a preocupação com o futuro dos meus alunos. Faço o que está ao meu alcance e só, sem grandes culpas e martirios. O que me tira da cama tão cedo mesmo no frio é a fidelidade para com os meus sonhos. Teimei em fazer essa faculdade, larguei o projeto temporário em que trabalhava quando fui convocada pelo estado mesmo sabendo que iria ganhar menos porque tinha convicção de que os papéis que eu organizava faziam muito menos sentido do que as aulas que eu poderia dar. Eu queria pertencer e ser fundamental.
Li o artigo do Pérsio Arida, presidente do BNDS na Piauí do mês passado, no qual ele conta sobre a Ditadura pra ele, fala da participação na VAR-PALMARES de Lamarca, da tentativa de escapar da prisão, da prisão, da tortura e da liberdade, sempre a luz de seus pais. Arida quase se arrepende daquilo tudo porque a tortura lhe doeu muito, mas termina seu texto com uma conclusão bonita: Em tempos de egoísmo, como não se orgulhar de ter tentado salvar a pátria?
Pois me sinto como ele, sou o filho que não foge a luta, não vou desistir agora. Sonhei isso pra mim, tive coragem de chegar até aqui e não quero desistir de tudo pra ser bancária. 681 reais é uma merda de salário, são os centavos do que ganham as minhas amigas do Ensino Médio, é uma vergonha. Eu queria poder comprar a bolsa que vi numa vitrine recentemente, queria um sapato bege, um tênis, eu queria viajar! Mas com 681 reais mal se vai e volta de Seropédica. Não tenho a ilusão de que serei feliz se permanecer pobre, mas acredito que vai chegar o dia em que eu vou ser melhor remunerada pelo que gosto de fazer. Se jogar tudo pro alto agora como vou me olhar no espelho? Quem eu vou ser? Sentirei ainda mais vergonha.
Não estou ali porque era a única opção. Eu escolhi aquilo pra mim. Vou até o fim.

2 comentários:

  1. Que lindo amiga, me emocionei muito com seu texto, é isso tudo mesmo, sem tirar nem pôr.

    ResponderExcluir
  2. Ci, que bom!! Você não está sozinha: eu também escolhi isso para mim e irei até o fim.
    Emocionante mesmo o seu texto!

    ResponderExcluir

Conte-me tudo.