terça-feira, 31 de maio de 2011

Monotemática.

Ontem quando eu saí de casa as cinco da manhã naquele frio aterrorizante e me deparei com a rua completamente deserta, antes que sentisse medo ou raiva, comecei a falar sozinha. Desde fevereiro minhas segundas feiras têm sido assim, as cinco horas lá estou eu: Indo trabalhar. Mas nunca o caminho tinha estado tão silencioso e hermo como ontem. Com certeza foi o frio.
Falei sozinha sobre a razão que me faz aceitar a condição de sair essa hora de casa para ir tão longe. Certamente não são os 681 reais que eu ganho. Também não é, por mais que isso exista, a preocupação com o futuro dos meus alunos. Faço o que está ao meu alcance e só, sem grandes culpas e martirios. O que me tira da cama tão cedo mesmo no frio é a fidelidade para com os meus sonhos. Teimei em fazer essa faculdade, larguei o projeto temporário em que trabalhava quando fui convocada pelo estado mesmo sabendo que iria ganhar menos porque tinha convicção de que os papéis que eu organizava faziam muito menos sentido do que as aulas que eu poderia dar. Eu queria pertencer e ser fundamental.
Li o artigo do Pérsio Arida, presidente do BNDS na Piauí do mês passado, no qual ele conta sobre a Ditadura pra ele, fala da participação na VAR-PALMARES de Lamarca, da tentativa de escapar da prisão, da prisão, da tortura e da liberdade, sempre a luz de seus pais. Arida quase se arrepende daquilo tudo porque a tortura lhe doeu muito, mas termina seu texto com uma conclusão bonita: Em tempos de egoísmo, como não se orgulhar de ter tentado salvar a pátria?
Pois me sinto como ele, sou o filho que não foge a luta, não vou desistir agora. Sonhei isso pra mim, tive coragem de chegar até aqui e não quero desistir de tudo pra ser bancária. 681 reais é uma merda de salário, são os centavos do que ganham as minhas amigas do Ensino Médio, é uma vergonha. Eu queria poder comprar a bolsa que vi numa vitrine recentemente, queria um sapato bege, um tênis, eu queria viajar! Mas com 681 reais mal se vai e volta de Seropédica. Não tenho a ilusão de que serei feliz se permanecer pobre, mas acredito que vai chegar o dia em que eu vou ser melhor remunerada pelo que gosto de fazer. Se jogar tudo pro alto agora como vou me olhar no espelho? Quem eu vou ser? Sentirei ainda mais vergonha.
Não estou ali porque era a única opção. Eu escolhi aquilo pra mim. Vou até o fim.

sábado, 28 de maio de 2011

Os calhordas também amam.

Hoje em Vale tudo, capítulo 170, a Fátima reencontrou o Cesar depois de 6 meses separados e ao vê-lo com um carrão comentou que ele devia estar numa boa. Ele respondeu a ela que aquele carro não era dele, que nada do que ele tem é dele, nem ela. Em seguida numa conversa com a benevolente tia Celina, Raquel disse não acreditar no amor de Fátima por Cesar. Para ela eles seriam apenas sócios, cumplices em empreitadas desonestas. Sua filha, ao seu ver, é incapaz de amar.
Está enganada Regina Duarte, a Fátima ama o Cesar sim. Os cafajestes também amam.
Fui apaixonada por um cafajeste por sei lá quantos anos. Era um cafajeste intelectual para as massas, gordinho de óculos e All Star. Aparentemente inofensivo. Sofri que nem um cachorrinho vira lata na chuva quando percebi que tinha sido só mais uma, apesar das palavras bonitas e dos momentos felizes. No entanto, em minhas investigações enlouquecidas pelas redes sociais, descobri a mulher que esse homem amava. Ela tem a minha idade, um nome estranho e uma pinta EXATAMENTE no mesmo lugar que a minha: do lado da boca. É magrinha, suburbana e lutadora. Ela que largou ele. Acredito que até hoje ele desconte a falta que sente dela em mocinhas como eu, cheias de esperança de serem especiais pra ele.
Recentemente me envolvi com um outro tipo de filho da puta, também gordinho, também de óculos e também intelectual, mas dessa vez acadêmico. Tudo muito parecido: Palavras bonitas, risadas, muito assunto, mas a bomba de que eu não era especial estourou logo nos primeiros dias. Acreditei que ele deveria estar num momento de galinhagem e bipolaridade, mas soube posteriormente que o danado tinha se apaixonado.
É lógico que o Carlos Alberto Ricceli deixa esses intelectuais de óculos no chinelo. Já disse num outro post que o Cesar não é para principiantes e esses rapazes serão principiantes para sempre. Eu só caí na conversa deles porque também sou principiante inclusive.
Acho o Cesar o personagem mais rico, dono dos melhores diálogos de Vale tudo.Temo que na vida real sejam os seus semelhantes os homens mais interessantes. Mas esses, os cafajestes sofisticados, eu ainda não conheci. Pela minha vida só passaram os mediocres.

Quanta luta, quanta luta!

Sexta feira a noite com chuva e chocolate. Último capítulo de Anos dourados.
Gilberto Braga, dono de todas as respostas que eu tenho procurado, fez do último capítulo dessa obra sem pecados um dos melhores finais que já assisti. Lurdinha e Marcos, depois de tantos percalços, duraram para sempre, Marina, neta do brigadeiro, namorou uma mulher, Marli, filha de mãe sensata, se casou duas vezes e Rosemery, a mal falada do grupo, essa sim, se casou virgem. Pedrinho, irmão de Lurdinha, sumiu nos porões escuros da ditadura e Claudionor, o amigo nerd, e portanto recalcado, de Marcos, que por ser militar poderia ajudar, não moveu uma palha sequer. Sapatinhos de cristal se esparramam pelo chão e a vida segue.
Estou trabalhando num projeto de pesquisa sobre o processo de anistia no Brasil. Nosso grupo entrevista pessoas que foram, de alguma forma, prejudicadas pelo governo por discordarem do status quo implantado pelos generais em 1964. Cada um dos entrevistados tem a sua verdade e a sua dor. As mulheres parecem ter sofrido mais, como de costume, mas são as que melhor superaram. Os homens ainda têm planos de heróis para o Brasil que sonharam e querem falar mais.
Reencontrei a história de Iara Iavelberg e Carlos Lamarca essa semana e tive inveja do amor dos dois. Acho que todos aqueles generais deviam morrer de inveja da capacidade de sonhar dessa gente que vai ser jovem pra sempre porque morreu no auge.
E "Anos dourados", com piscinas, margarinas e carolinas, conquistou meu coração.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Recalque.

Só não me jogo da janela porque minha cachorra não entenderia nada e sentiria muito a minha falta. Só minha cachorra me ama de verdade, só ela não me julga e não me abandona. Hoje chorei todas as lágrimas que tinha disponíveis. Depois dormi pesado em pleno meio dia de quinta feira. Desliguei os telefones e quis ir embora desse mundo cruel que não me permite amar.
Ainda não acordei.
Não sou uma pessoa triste, odeio gente triste e reclamona, mas olhar para os lados e perceber que tudo o que eu sou, cada pedacinho meu construído ao longo de 26 anos, cada palavra dita com cuidado, os vestidos, as mãos e o desejo de acertar, nada disso é suficiente pra fazer qualquer pessoa querer estar ao meu lado é muito difícil.
Vejo os homens que passaram pela minha vida seguindo em frente, sendo contemplados com diversas possibilidades de vida a dois e eu aqui, a moça feia debruçada na janela sem banda nenhuma tocando pra mim.
Me lembro daquele filme "Alfie, o sedutor", em que o Judie Law maltrata todas as menininhas inocentes e termina fudido encontrando a ex numa cafeteria com o namorado. Queria ser ela. Penso também nas frases finais do conto do Caio Fernando Abreu, "Aqueles dois", que dizem: "  Quase todos ali tinham a sensação de que seriam infelizes para sempre. E foram.". Queria que todos esses homens que já sabiam que eu era fraca e mesmo assim se aproximaram, esses que me beijam e não telefonam, os que me mandam emagrecer durante o namoro e depois vêm me perguntar onde era mesmo aquele restaurante que nós fomos pra ele ir com a nova namorada e os que se sentem no direito de me usar, apesar de todos os sentimentos que eu demonstro, que todos eles sejam infelizes pra sempre, que descubram que o mundo não é grande como eles acham e que nem todas as mulheres têm a minha disponibilidade para relacionamentos. Que sejam frustrados e ridículos para toda a eternidade.
Mas se a vida os deixar impune, que pelo menos eu me conforme e não espere mais companhia para o cinema. E que não os encontre nunca mais.
Amém.

A Tijuca e os Anos dourados.

Nenhum lugar do mundo é mais conservador do que a Tijuca. Esses dias eu estava atravessando a Praça Sães Peña, coração ensolarado do meu bairro amado, quando vi um carinha rock'n roll que eu sempre encontro no metrô. A gente se olhou e passou direto. Pensei que como eu, ele também é um sobrevivente. Não é fácil.
Tenho assistido "Anos dourados" na reprise do Viva e penso que meu bairro conflitante é, de fato, o cenário perfeito pra essa sutil minissérie. Gilberto Braga, o Machado de Assis da minha existência atual, morou em Vila Isabel e certamente entende da hipocrisia que se perpetua por aqui desde sempre. Nunca fomos avant garde.
Nessa histórinha de 20 capítulos filmada em 1986, mas que se passa na década de 1950, é contado o drama de Lurdinha, estudante do Instituto de Educação e aluna da Aliança Francesa, filha da dona de casa Celeste e do médico Carneiro. Ela se apaixona por Marcos, aluno do Colégio Militar e filho da caixa de boate Glória. O amor é proibido pela família tradicional da moça, mas aos poucos as máscaras caem e os dois têm o final feliz que merecem.
Anos dourados é uma critica ao som de bossa nova ao conservadorismo atemporal que existe em todas as sociedades, mas que por aqui é bastante acentuado. Em um diálogo, Lurdinha diz a mãe de uma amiga que sua mãe nunca tomou banho depois do almoço porque sua avó dizia que matava. Sua avó também nunca o fez porque sua tataravó ensinava o mesmo e assim por diante. Ela se pergunta por que, nenhuma vez, qualquer uma delas não questionou a crença sem sentido e diz que não quer ser como elas, que quer experimentar a vida. A mãe da amiga, professora de Geografia modernosa, que ia ao cinema ver Fellini, diz que pode garantir que tomar banho depois do almoço não mata ninguém. Lurdinha fala isso tudo porque questiona o tabu do sexo antes do casamento e percebe que não será menos respeitada se transar sem ser esposa.
Assisti a esse capítulo específico numa sexta feira a noite da qual eu esperava todas as aleluias possíveis e que estava sendo terminada em casa, só com a televisão e biscoitos. Posso dizer que valeu a pena, embora não tenha sido uma escolha, mas sim uma contingência do atual momento de solidão inabalável.
Recentemente sai com um menino que pensa que é homem. Ele morou na Tijuca quando era criança e me disse mais de uma vez que gostava daqui, sentia familiaridade, mas jamais voltaria pra cá. Não gostei de ouvir isso. Só eu posso falar mal daqui, eu e o Gilberto Braga, os outros, menos sensiveis e competentes, esses não.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

O Brasil de Amanda Gurgel.

O que mais me chama atenção no fenômeno Amanda Gurgel é o fato de colegas publicitários, engenheiros, museólogos, donas de casa e até advogados que ganham 17 mil reais por mês (não ganho isso nem em dois anos) terem postado esse link apoiando a fala da professorinha.
Quero dizer aos nobres apoiadores que agradeço a solidariedade, mas não me comovo. Vocês não se importam mais com o Brasil ao propagarem esse vídeo. Vocês não entendem mais do Brasil porque mostram, em suas redes sociais a revolta da jovem potiguara. O mundo em que vocês vivem não é o mesmo que o dela e a maioria de vocês não move uma palha para modificar isso.
Quantas vezes ouvi que não deveria ser professora? Quantas vezes ouvi que com os meus alunos é melhor desistir? Quantas vezes, queridos amigos, eu não assisti aulas de acadêmicos que discorrem com propriedade sobre a educação básica, mas que nunca estiveram em uma sala de aula com 55 adolescentes pobres? Alguns até estiveram, mas correram assim que puderam dessa experiência tão enriquecedora quanto dolorosa.
Os filhos de vocês, que ao aplaudir esse vídeo pretendem se sentir brasileiros mais participantes, estudarão em escolas particulares de qualidade e farão cursos de lingua estrangeira desde cedo. Comigo foi assim. Curso de inglês, francês, informática, redação, teatro, coral, aula particular...pra ganhar pouco. Pra pegar dois ônibus e demorar duas horas pra chegar no trabalho. Pra muitas vezes falar sozinha.
Tocar corações? Ser fundamental? Receber abraços e carinhos quando atravesso a rua em frente a escola? Gostar de verdade de tantos meninos e de tantas meninas e perdoar, sem muita reflexão, os que me desrespeitam? Isso também tem.
No entanto, eu vos digo: Esse Brasil é meu.
Meu, de Amanda e de quem mais tiver coragem.
Não finjam que entendem a nossa realidade.
O Brasil de vocês é outro.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

O cavalo da vez.

Quando eu li "A Revolução dos bichos" do George Orwell fiquei profundamente comovida com a situação do cavalo. O livro é uma critica em forma de metáfora aos regimes totalitários. É a história dos porcos que tomam o poder e decretam que cada bicho terá uma função social estabelecida. O cavalo é quem carrega o país nas costas. Sempre obediente, resignado e fiel. Ele acredita nos porcos e acorda cada vez mais cedo para fazer a sua parte. Não houve fatia do bolo pra ele.
Me lembro que demorei muito pra terminar de ler tão poucas páginas, tamanho era o meu incômodo com a benevolência do cavalo. Um dia liguei para o meu pai, que foi quem me indicou o livro e disse: "Não quero mais ler esse livro não! Muito chato! Coitado desse cavalo!" Eu devia ter uns 15 anos. Meu pai me disse: "Cecília, o cavalo é o povo".

(Prezado leitor, vá beber água e pense sobre isso.)


Nunca me esqueci da frase do meu pai. "O cavalo é o povo". Meu Deus, que coisa triste!
Pois bem, tenho visto muita novela, vocês sabem, e em "Anos Dourados", esse primor de minissérie de 1986 que está sendo reprisada pelo Viva, existe uma personagem chamada Glória, que é interpretada pela Betty Faria quando ainda não existia botox e ela era bonita de verdade. A Gloria é uma mulher divorciada na década de 1950, ela sustenta o filho sendo caixa de boate e é amante de um oficial da Aeronáutica.
Ela é, pra mim, o melhor personagem da trama. E é, nessa história, o cavalo.
Duro.

Cardápio.

Todos os dias tenho tomado café. Um café e um chocolate. Não é qualquer café. Não é qualquer chocolate. Não entendo de um e sei muito pouco sobre o outro, mas gosto quando o café vem bem grossinho, prefiro com adoçante do que com açucar e tem que ter um cheiro específico que não faz a cabeça doer, pelo contrário, é um aroma aberto, que aguça as possibilidades do momento posterior.
Chocolate também não pode ser muito doce, nem pode ter aquele aspecto pastoso que as barras da Garoto têm. Chocolate sofisticado também tem o cheiro permissivo, nada que anuvie o olfato ou que pese a mente. Chocolate bom é marrom, cremoso e tem o sabor que envolve o paladar devagarzinho.
Água com gás vai bem com café e chocolate, só um copinho.
Também tenho gostado muito de azeite clarinho, com torrada crocante.
Palmito pupunha na manteiga, queijo de cabra, chutney de manga, nozes...
Nós dois embaixo do edredom vendo televisão.
De você basta arroz, feijão, café com leite, pão, carne e coração.

domingo, 15 de maio de 2011

Pacto Colonial.

Fui a Paris conhecer um grande amor, mas poderia ter ido a Saquarema.
Só aconteceu em Paris porque era um sábado de manhã. Se fosse na quarta-feira, teria sido na estação Cinelândia do metrô, bem na hora que o vagão esvazia e os trabalhadores que carregam o Brasil vão assinar seus pontos. Operários?
O grande amor, cristalizado na cidade luz e nas águas antigas do Sena era você.
E eu, sem Brasil nenhum, te chamei pra ser meu num daqueles palácios. Quis construir pra você um jardim sem agrestes. Eu quis te dar todas as minhas torres.
Nenhuma praia seria suficiente pra avalanche de novidades que era você.
Eu poderia ter te amado.
Não amei porque levo comigo esse Brasil impiedoso todos os dias e todas as noites.
Porque não sei como são as ondas calmas do rio que ficou vermelho com o sangue dos sonhadores.
Conheço apenas as águas revoltas que beiram a estrada.
Lido com invasores, ninguém fala a minha lingua.
Faltam longos meses de mar e tempestade pra eu te encontrar.
É o destino da América não ter rainhas.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Senhora de nenhum amor.

Desde ontem a noite, quando o Marcelo Camelo cantou "A outra" no show do Circo voador, não me sai da cabeça a expressão "Senhora desse amor". Me lembrei daquele filme Mademoiselle Chambom, que é a história do pedreiro que se apaixona pela professora do filho dele quando a vê tocando violino. Os dois vivem com intensidade a paixão, mas nunca se tocam. Só no final, quando ela está indo embora, eles transam enlouquecidos de desejo de serem felizes juntos. Essa mulher era senhora do amor daquele homem, como na música.
Me pergunto se alguma vez eu fui senhora do amor de algum desses homens inconstantes pelos quais me apaixonei. Acredito que tenha sido, mas acrescento: Como é difícil ser senhora de um amor só as vezes!
Esses dias um menino, desses que jogam bola e tal, perguntou se eu não queria ir com ele numa apresentação de uns artistas alemães, porque ele já tinha convidado todos os amigos, mas nenhum tinha se interessado e eu era a última opção. Disse ainda que eu poderia ficar tranquila que ele não estava dando em cima de mim. E dois dias depois falou que desistiu do show porque lembrou que tinha curso de francês na mesma hora.
Vários aspectos dessa história me intrigam. O primeiro: É um menino bonitinho, da minha idade, mas ainda menino, apesar de ser inteligente e morar sozinho e eu, apesar de estar a procura de homens, até o acho interessante e sempre dou atenção a ele, mas tenho CERTEZA de que ele nunca me beijaria. Deve me achar legal, gente boa, inteligente e bacaninha, mas só. Pesa o fato de eu não ser magra, de não ser frágil e de não ser mais menina. Garotos assim, quando se interessam por mim, estão procurando a mãe e não a mulher que eu ofereço.
O outro aspecto que me intriga é o aviso prévio dele em relação as intenções que envolviam o encontro. "Eu não estou te cantando", ele disse, eliminando qualquer esperança de flerte que eu pudesse vir a ter, com certeza por achar que eu, mulher carente e gordinha, certamente me encantaria por ele. Não houve dúvida por parte dele de que por ele nada aconteceria e que por mim aconteceria tudo.
O terceiro aspecto que me incomodou foi a posterior desmarcação. Imaginei que ele deva ter ficado um dia sem dormir pensando no quanto seria embaraçoso sair sozinho comigo, se perguntando o que faria caso alguém nos visse e achasse que estávamos juntos.
Preciso dizer que o entendo. Só que depois disso, quem tem (ainda mais) medo sou eu. Tenho medo de só encontrar homens como ele pelo meu caminho. Tenho medo de nunca servir completamente pra ninguém.
Me pergunto se toda a minha desenvoltura em relação a mim mesma, todo o meu desapego a limites sexuais e a minha culpa sublimada em relação ao peso, se tudo isso não faz com que os homens só me permitam ser senhora do amor deles por pouco tempo.
Esse menino nem é importante pra mim e eu não me chateei com ele, mas não gostaria de ser avisada novamente de que estou sendo convidada por último e de que comigo não há possibilidade de interesse.
Queria ser senhora dos sonhos de alguém.

domingo, 8 de maio de 2011

Vale tudo é vintage.

Já faz um tempo que eu venho pensando em escrever sobre Vale tudo, mas por preguiça e medo de cair na obviedade, posterguei essa nobre tarefa. Hoje, no entanto, se tornou inevitável.
Se você não assiste Vale tudo, rogo que não abandone por aqui a leitura, sou boa em contar histórias e garanto que você entenderá tudinho. Se você assiste e sabe o quilate da obra, me convide para um café qualquer dia.
Imagino que mais de mil pessoas já devam ter escrito sobre isso, mas nem ligo, eu só tinha 3 aninhos quando Vale tudo foi exibida pela primeira vez e, agora, com 26, assistindo a reprise, é justo que eu dê minhas impressões.
Vale tudo é a odisséia de Maria de Fátima (Glória Pires, comedida desde aquela época), menina do interior que queria ser rica. Ela vende a casa em que mora com a mãe, Raquel (Regina Duarte acertadamente cafona e passada do ponto), deixa a coitada na rua e usa o dinheiro pra ir atrás, sem nenhum escrupulo, da sua felicidade. A pedra no caminho da Fátima é o segundo diamante da novela, Cesar (Carlos Alberto Ricceli com cheiro de homem), o ex-modelo decadente, de voz doce e ferormônios latentes, que num dos diálogos mais bonitos da trama diz a ela que a coisa mais triste que existe é fim de festa.
Cesar e Fátima unidos alternam esperteza e culpa de forma que um nunca deixe que o outro se arrependa das maldades que planejam jutos. Eles têm jeito de gente boa, gente que dá beijinhos quando encontra na rua, que chora quando sente dor e tem dor de barriga quando come bolo quente. É por isso que convencem.
Fátima consegue se casar com o namorado da amiga lutadora, descolada e honesta, do tipo que calcula sozinha o imposto de renda e que em 1988 já comia comida japonesa: Solange Suprat (Lidia Brondi coquete). A ruivinha confiou na cara de boa moça da Fátima e no olhar consternado do Cesar e, com o perdão da expressão, se fudeu de verde e amarelo.
O namorado da Solange, que vira marido da Fátima é Afonso Roitman (Cássio Gabus Mendes honesto), rapazinho de caráter, que faz lembrar aquele rico bacana que foi da sua turma na faculdade e que quando teve o casamento do colega da Vila da Penha, não só compareceu, como levou presente. Afonso é imaturo para o amor, mimado e temperamental. Grita com uma facilidade irritante e odeia ostentação. Se casa com Maria de Fátima porque acredita na simplicidade, no sorriso puro e na carinha de esposa que ela tem.
Nada disso teria acontecido se não fosse o diamante número um da novela, Odete Roitman (Beatriz Segall grandiosa), o gênio de olhos azuis. Odete me lembra um pouco uma orientadora que eu tive na graduação que também ia muito a França e tinha olhos azuis enormes. São incontáveis os acertos na construção do personagem: É o tom agudo que ela acrescenta ao final de cada palavra, a simpatia cocomitante a arrogância, o apreço pelo trabalho em paralelo com a desonestidade e as tiradas mal humoradas sobre o Brasil. Odete é tão forte que para fazer a novela andar a contragosto da vontade dela, Gilberto Braga precisou matá-la. O calcanhar de aquiles de Odete são os jovens rapazes bonitos. Depois de patrocinar o casamento do filho com Maria de Fátima, ela se apaixona justamente pelo amado da nora e protagoniza com ele os melhores momentos da novela na minha opinião.
Pra mim, uma das melhores cenas da Fátima com o Cesar acontece num dia em que os dois estão no apartamento dele a tarde, cada um em um sofá, cada um lendo uma revista. Ela gosta tanto dele que vai passar a tarde com ele pra ler revista, tamanhos são a paz e o conforto que sente com a presença do amante. Isso é amor maciço, coisa pura.
Já com Odete são os diálogos que me emocionam. Cesar diz a ela, quando se conhecem, que, como ela, adora uma baixaria. Caríssimo leitor, ele está falando de baixaria pra Odete Roitman, não tem Valeska Popozuda na jogada. As palavras dos dois transbordam tesão. Os olhares excitados me deixam intrigada. É um homem de 35 anos com uma mulher de 60. É um homem falcatrua com uma mulher dessas que saem na lista dos dez mais da Forbes. Baixaria não é coisa pra principiantes.
No diálogo em que os dois se beijam ela pergunta e ele em que pode ajudá-lo e quer saber se ele quer voltar a trabalhar na empresa dela. A resposta do cafajeste não sai da minha cabeça. Ele diz: "Não, Odete. Minhas razões são muito mais prosaicas do que isso. Eu preciso de dinheiro"
GENTE, não sei se toca a vocês como tocou a mim, mas percebam a magnitude e engenhosidade braguiana: Cesar poderia enrolar, contar uma história triste ou fazer caras e bocas. Poderia ser o canalha típico que resolve todas as questões com o mesmo palavreado vulgar, mas não, ele é requintado, bem educado e ao contrário do filho de Odete, nunca altera o tom de voz. Pedir dinheiro usando a expressão "prosaico"? Cesar também não é para principiantes.
Eu e um amigo, desde que começamos a assistir Vale tudo, toda vez que nos enxergamos neuróticos por questões amorosas, evocamos a personagem mais chata da trama: Heleninha Roitman (Renata Sorrah com muita vodka). Despenteada, enjoada e melosa, sofisticada a toa mesmo, faz com que nós tenhamos pavor de nos parecer com ela. Sem Odete ela não teria tido competência para tirar Ivan (o Antônio Fagundes mais bonito de todos os tempos) da mocinha Raquel.
Ivan se mostra corruptivel durante quase toda a novela, Raquel não. Ela é a mãe que vai atrás da filha pródiga, é cozinheira que vende sanduiche na praia embalada por Catenao Veloso cantando "Brasileirinho", é mulher que grita, se descabela e fala mais do que deve. Ela e Heleninha são a cruz e a espada de um homem comum, desses que quer ganhar bem pra levar o filho à Disney. Também tenho medo de ser como a Raquel, mas no fundo gosto dela.
Há ainda muitos personagens marcantes, o ex-marido da Helena e aliado de Odete Roitman na empresa TCA, Marco Aurélio (Reginaldo Faria ou Jesse Valadão?), que hora é lobo na pele de cordeiro, hora é um homem fofo igual ao pai da sua amiga que buscava vocês de madrugada nas festinhas de 15 anos do segundo grau. Tem a Leila (Cássia Kiss gostosa), ex-mulher do Ivan, que é mulher normal, na melhor das definições, e que como todas nós, quer se sentir amparada e amada, por isso se casa com o Marco Aurélio cordeiro, fingindo que nem sabe que existe lobo.
Tem a Aldeíde (Lilia Cabral sem chapinha), mulher alta de voz fina e olhos enormes, que é tão sem vergonha que causa inveja na melhor amiga Consuelo (Rosane Goffman sempre tijucana), secretária quarentona daquelas que morrem de vontade de se meterem numa baixaria, mas são principiantes e covardes.
Tem a Iris (Cristina Galvão subestimada), que é secretária junto com a Consuelo, mocinha de Irajá que mora com a avó e é eficiente no trabalho, mas travada em tudo. Iris é como a maioria das mulheres brasileiras que não encontra o homem dos sonhos e têm que se conformar com a realidade. Antes mal acompanhada do que só. Ela conquista o coração do Poliana (Pedro Paulo Rangel impecável), homem bom e sem jeito, coadjuvante primordial da trama.
E tem o Brasil, que naquela época era um projeto de Democracia em crise constante, cheio de gente de bem e de vigaristas, mas que ainda não tinha descoberto o câncer do políticamente correto e que por isso, pode ser o cenário desse espetáculo todo.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Batom para ninguém.

O pior de gostar e não ser correspondida é me lembrar dele quando eu me sinto bonita. Pensar nele na solidão da sexta feira a noite é fácil, mas passar o batom pra ele sem que ele queira ver é terrível.
As redes sociais também potencializam bastante a saudade. Ele ali, cheio de assuntos, novidades e tudo o que eu não sei mais como está, online, disponível para conversar e longe de mim me mata.
Tenho tentado aprender a ser indiferente. Consegui sair com dignidade da última relação sem maiores prejuízos para o nosso contato virtual (meu e do ex), mas com esse último, justamente por eu gostar de quase tudo o que ele diz, fica difícil não esperar um "oi" de misericórdia.
Talvez com ele eu não quisesse contar nada, acho que só quero ouvir. Pode ser carência também, deve ser.
Hoje postei no Facebook uma foto de biquini(!) na qual estou do lado de um grande amigo só pra causar ciúmes nele. Pra fazer ele lembrar da minha pele, das minhas risadas e da minha liberdade. Não adiantou nada.